Educação é direito das comunidades do Semiárido
Foto: Acervo do Centro Sabiá
Educação é direito das comunidades do Semiárido
Em abril, foi comemorado o Dia Internacional da Educação e, em tempos de pandemia, os desafios se amplificam no acesso a esse direito, especialmente quando falamos do acesso à educação no Semiárido, quando se entrelaçam os direitos à educação e à água. É preciso falar das ações ao combate do coronavírus através das escolas – ainda que fechadas para os estudantes. O Programa Cisternas nas Escolas, da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) é uma das políticas de convivência com o Semiárido que se baseia na principal estratégia do povo do Semiárido, que é a estocagem, uma estratégia tão eficiente, que fez com que instituições como Unicef, como Governo Federal – em algum momento cobrasse a ASA por uma ação de cisterna que mobilizasse as comunidades escolares, o que culminou com a criação do Programa Cisternas nas Escolas. Essa é a história que nos conta Rafael Neves, coordenador do programa na ASA Brasil.
“O eixo que proporciona este diálogo entre os direitos é a educação contextualizada com a convivência com o Semiárido. Antes de tudo, educação é um direito assegurado pela Constituição Brasileira, que protege todo o povo. É garantido a todo mundo o direito de estudar, de ir à escola. Contudo, a população do campo é a que mais sofre nesse sentido. No sentido de ter uma educação de qualidade, no sentido de ter uma escola próxima a casa”, afirma Neves.
Para além do histórico do descaso com a educação rural, com as condições das escolas e das condições de contratação dos profissionais, nos últimos anos o segmento vem enfrentado uma política de nucleação, que na prática representa o fechamento de centenas de escola no semiárido brasileiro. Outro problema apontado é que, com o argumento de economia de recursos, as crianças são colocadas muitas vezes a passar mais de duas horas por dia em transporte escolar para ir e voltar da escola. Porque a nucleação que fecha as escolas rurais, acaba concentrando as escolas nas sedes dos municípios – nas sedes urbanas.
Foto: Vládia Lima / Acervo do Centro Sabiá
Ainda segundo Neves, “poderia haver a opção de nuclear, já que são poucos alunos em algumas comunidades, mas nuclear garantindo que a criança não ficasse muito longe da escola e nem que fosse fora do espaço rural. Eu estou falando de criança de 1 a 8 anos – estudantes da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental. Nessa perspectiva, a falta de água nas escolas também sempre foi um motivo a mais para nucleá-las. Tirando ela do espaço rural – porque havia falta de água – e levando-a para os espaços urbanos. Nesse sentido, a garantia à água com as cisternas se soma à luta de garantir uma educação contextualizada. Uma educação que as crianças tenham o direito de estudar no campo e a partir dos saberes do campo. O saber do campo – que o povo do campo aprende que não se luta contra a natureza, se aprende a conviver com ela. É nessa educação que a gente acredita que pode reduzir os índices de evasão escolar, porque é uma educação com mais sentido e mais respeito aos saberes do lugar”.
O Programa Cisterna nas Escolas é um programa de formação e capacitação da comunidade escolar. A ideia também é aproximar mais as professoras e as coordenações pedagógicas para se sentirem desafiadas coletivamente a tentar novas experiências escolar – didáticas, de forma que envolva mais a realidade e mais os alunos. “As merendeiras também se sentem valorizadas. Elas participam de uma formação de gestão de recursos hídricos e segurança alimentar. São profissionais que cuidam das crianças, cuidam dos filhos das famílias do Semiárido – e que nunca passaram por um espaço de formação. Elas nunca foram reconhecidas pela importância que elas têm. E elas têm sentido muito, porque o acesso à água vira outra realidade com a cisterna na escola. O não fechamento de escolas, seja pela viabilidade que a água proporciona por manter as aulas ou por comunidades organizadas que se mobilizam para impedir o fechamento de escolas e a diminuição dos dias letivos sem aula”, enfatiza o coordenador do programa.
Foto: Vládia Lima / Acervo do Centro Sabiá
Garantia da merenda escolar – Com a pandemia, as escolas permanecem fechadas na área rural. Ainda para Neves, “o isolamento social é importante, pois as crianças são potencial vetor de doenças. A fragilidade do sistema de saúde no interior – sem respiradores, sem profissionais – pode levar a uma catástrofe, se o vírus se espalhar rápido demais no ambiente rural brasileiro. É fundamental hoje, que a escola permaneça do jeito que estar – fechada – para que ela seja um aliado nessa catástrofe que possa vir a ser com essa situação de descaso na saúde”.
A garantia da merenda escolar durante esse período, ainda segundo o especialista, reforça o papel de organização comunitária que a escola tem, e que ainda é muito pouco explorado no Brasil. No campo, até por conta das limitações orçamentárias, esse papel fica mais claro. A escola é muitas vezes espaço de organizações e reuniões das comunidades. “É o espaço de atendimento do programa Saúde da Família, de campanhas de vacinação, onde os agentes de saúde promovem reuniões com as famílias da comunidade. Se a escola assume com maior intencionalidade esse lugar de articuladora da comunidade é fundamental. Para nós, da ASA, seria importantíssimo que mais municípios e escolas aderissem ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Ele compra os produtos direto da agricultura familiar – produtos com qualidade, produtos com procedência local – para a alimentação das crianças. A gente sabe que a escola é esse espaço de ação social, no sentido de garantir a alimentação das crianças. Então, ela não estar cumprindo nada mais que sua função principal, que, nesse momento, é garantir a alimentação nas mesas das crianças: nos seus lares”, conclui.
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