Enfim Pernambuco cria lei para Agroecologia e Produção Orgânica
Foto: João Roberto Ripper / Acervo Centro Sabiá
Rosa Sampaio – Núcleo de Comunicação do Centro Sabiá
Lei de agroecologia é criada depois de mais de quatro décadas de luta de
famílias agricultoras, comunidades rurais, movimentos e organizações sociais
Este ano de 2021 começou com uma notícia importante para agricultores e agricultoras pernambucanos. Atendendo a uma demanda de camponeses e camponesas, famílias agricultoras, movimentos e organizações da sociedade civil de Pernambuco, o governo estadual sancionou, no dia 8 de janeiro, a Lei 17.158 que institui a Política Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica.
Com foco na promoção da agroecologia e fortalecimento do sistema orgânico de produção agropecuária, a lei tem o objetivo de contribuir para o desenvolvimento sustentável e a qualidade de vida das populações do campo e da cidade e foi construída ao longo do ano de 2019 pela Comissão Estadual Agroecológica e de Produção Orgânica do Estado de Pernambuco, composta por nove representantes do governo e nove representantes de organizações e movimentos da sociedade civil como a Articulação Semiárido de Pernambuco (ASA-PE), Fetape, MST, Centro Sabiá, a ONG CAATINGA, a Casa da Mulher do Nordeste, o Serta e Cáritas Regional NE II.
A Comissão construiu a política que foi aprovada pela Assembléia Legislativa de Pernambuco e pelo governo Estadual, tendo como base fundamental todo legado de lutas, experiências e trocas de saberes de famílias de agricultoras e agricultores, povos tradicionais, trabalhadoras e trabalhadores do campo, movimentos e organizações da sociedade civil. Atores sociais que contribuíram ao longo de quatro décadas com a construção de um novo modelo de agricultura inclusiva, que na mesma medida que produz alimentos saudáveis e livres de venenos, também recupera e conserva as fontes de água, a fertilidade do solo, a flora e fauna local, respeitando assim a biodiversidade de cada bioma, de cada região.
Um modelo de produção de alimentos focado na valorização do conhecimento de mulheres e homens do campo, dos saberes ancestrais dos povos originários e tradicionais, de comunidades rurais e das suas diversidades, construindo mercados sociais mais justos e menos depredadores, consolidando assim uma relação de bem viver com a natureza. Com o apoio de Cooperações Internacionais, a sociedade civil pode promover encontros e trocas das diversas experiências e saberes e incidir junto ao Governo Federal e governos estaduais para pautar a política e o plano de Agroecologia e Produção Orgânica.
Para Carlos Magno, um dos coordenadores do Centro Sabiá e representante da organização na Comissão Estadual, o estado de Pernambuco deu um passo importante com a acolhida do governo a esta pauta histórica de agricultoras e agricultores, movimentos e organizações do campo, mas pontua a importância dos próximos passos para que a política se efetive de fato, como a elaboração do plano de execução da política e a dotação orçamentária.
“Uma política publica precisa de fato existir, sair do papel e para isso precisa detalhar como fazer e quais os recursos financeiros para executá-la, se não vira mais um papel na gaveta. É esse agora o desafio do governo do Estado de Pernambuco. Precisamos saber do orçamento e quem irá construir o Plano de Agroecologia e de Produção Orgânica do Estado, visto que a Comissão foi criada com este propósito, mas se venceu em dezembro de 2019. Então estamos aguardando que o governo detalhe como vai fazer para que realmente tenhamos uma política estadual de agroecologia e produção orgânica”.
Na imprensa, o governo do Estado declarou que a Política Estadual de Agroecologia, construída conjuntamente com os movimentos sociais, será gerida pela Comissão Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica, composta paritariamente por representantes da sociedade civil e do Governo do Estado, e coordenada pela Secretaria de Desenvolvimento Agrário (SDA) e que caberá à comissão elaborar o Plano Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica, acompanhar os programa e ações inerentes ao plano e propor as suas prioridades ao governador. Mas não falou se irá, por decreto instituir uma nova comissão, sabendo que o prazo de existência da comissão anterior foi de dezembro de 2018 a dezembro de 2019 e não foi renovada pelo governo.
Foto: Ana Lira / Acervo Centro Sabiá
A pauta da agroecologia e da produção orgânica no Brasil
Trabalhadoras e trabalhadores do campo, produtoras e produtores familiares, comunidades rurais e quilombolas, povos originários e tradicionais, movimentos do campo e organizações da sociedade civil de todo o País, vem há mais de 40 anos experimentando modelos de produção sustentável, discutindo, promovendo debates, trocas de saberes e buscando pautar a agroecologia e a produção orgânica junto a governos estaduais e Federal. Com a apoio das cooperações internacionais promoveram encontros regionais e nacionais para juntos construírem propostas para uma política de agroecologia e produção orgânica, que representasse as diversidades dos biomas presentes no território brasileiro.
Dos primeiros encontros, nasceram muitos movimentos de trabalhadores, fóruns e articulações, como a Articulação Nacional de Agroecologia, a ANA, e a Articulação Semiárido Brasileiro, a ASA. Alexandre Pires, representante do Centro Sabiá na ASA e na ANA lembra que o segundo Encontro Nacional de Agroecologia (ENA), aconteceu no Recife, em 2006, tendo a frente da realização, organizações pernambucanas como o próprio Sabiá, a FASE PE e a Diaconia.
“Os movimentos de agroecologia foi se construindo como uma abordagem nacional, que ao longo desses anos vem pautando os governos, com incidências políticas em encontros, chamando ao debate. Esses processos de construção dos encontros foram permitindo a adesão e as trocas sobre as experiências em agroecologia entre agricultoras e agricultores, comunidades, movimentos e organizações sociais e governos, partindo para a construção da política nacional e incentivando os estados a também discutir as suas políticas e planos”, detalhou Alexandre Pires.
Em 2012, fruto de mobilizações em todo o país, em especial da pauta da Marcha das Margaridas de 2011, que levou a Brasília a importância do debate e da política de agroecologia, o Governo da então presidenta Dilma Rousself (PT), sancionou a Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Pnapo). E a partir daí muitos estados brasileiros criaram suas políticas, como Minas Gerais, Rio Grande do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Ceará, entre outros.
No contexto atual, nunca se fez tão urgente e necessário que as gestões de estados e municípios acolham as demandas do campo e criem as leis estaduais e municipais de agroecologia e produção orgânica, visto que a Política Nacional, a Pnapo, premiada internacionalmente, vem sendo fragilizada pelo Governo Bolsonaro e Mourão, com esvaziamento orçamentário e político, com a extinção dos órgãos de gestão e de controle social da política.
Com a reforma administrativa operada pelo governo Bolsonaro (Lei 13.844, quem tem como origem a MP 870/2019) e o Decreto 9.759/2019, instâncias estruturantes da execução da Pnapo foram extintas: a Câmara Interministerial de Agroecologia e Produção Orgânica (Ciapo) e a Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Cnapo). Os espaços eram responsáveis, respectivamente, pela gestão e controle social da política.
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