Articulação no Semiárido Brasileiro (ASA): uma trajetória de lutas e diálogos em defesa do Direito à
Reprodução do artigo original em espanhol publicado no jornal mexicano La Jornada
Por Alexandre Henrique Pires
O atual modelo hegemônico de desenvolvimento tem sido a principal causa das crises ambiental, energética, alimentar e econômica que temos presenciado, esse modelo baseia-se na exploração irracional dos bens naturais para ampliar o consumo, e está pautado no crescimento econômico de poucos grupos, e no acumulo de capital privado. Essa lógica tem gerado, entre outras coisas, um esgotamento dos bens naturais disponíveis no ambiente, uma ameaça aos conhecimentos e territórios de povos tradicionais, e a um aumento, cada vez maior, das desigualdades socioeconômicas. Direitos básicos dos povos têm sido negados, ou não assegurados, pelos Estados uma vez que seu atrelamento ao mercado capital conflita com os Direitos e interesses populares. No Brasil, embora tenha havido conquistas importantes para a população mais pobre nos últimos 12 anos, muitas dessas conquistas são frutos de lutas e habilidades de diálogos, mas ainda de pouco alcance em relação às necessidades.
Historicamente as políticas governamentais para o Território do Semiárido brasileiro, com mais de 960 Km², 1.133 municípios e uma população de aproximadamente 22 milhões de habitantes, dos quais cerca de 8,7 milhões vivem no campo, seguiram a lógica do desenvolvimento dominante, investindo em ações emergenciais e em obras que beneficiaram na maioria das vezes o setor empresarial e o latifúndio. Iniciativas que reforçaram a concentração de poder econômico e político no território, e geraram por décadas a dependência da população às iniciativas emergenciais, sobretudo para população camponesa.
As organizações da sociedade civil e movimentos populares sempre têm semeado e buscado reagir a estas políticas, quer desenvolvendo experiências que demonstrem a possibilidade de perspectivas diferentes, quer interferindo e construindo políticas. Assim nasceu a Articulação no Semiárido Brasileiro (ASA), cujas ações em realidade já existiam, mas de modo esparso entre as organizações. A ASA nasceu sob a égide de articular as ações da sociedade civil, na perspectiva de interferir nas políticas. Tendo o Direito à Água e a Convivência com o Semiárido, como estratégias de mobilização social da população desse Território, que é diverso por sua riqueza cultural, ambiental, social e de identidades.
Sistematizar os conhecimentos dos camponeses e camponesas de modo a gerar reflexões e aprendizados, são bases importantes para valorizar as identidades, os saberes populares e estabelecer canais de diálogo com os gestores das políticas públicas. O conhecimento construído e vivido por camponeses e camponesas está no centro dos diálogos e negociações da ASA com o governo federal, onde se mostra a importância de investir em tecnologias simples, de baixo custo, com capacidade de escala e de transformação das realidades. A partir do diálogo, já em 2003 o governo brasileiro, assegurou no orçamento plurianual, recursos para financiar a construção de Cisternas de captação e armazenamento de água das chuvas para consumo humano. Hoje são mais de 800 mil já construídas com a participação de centenas de organizações membros da ASA, como sindicatos, igrejas, ONGs, associações e cooperativas de base. A Articulação também defende como princípio a instituição de mecanismos e formas de gestão e controle social das políticas públicas, com a participação das organizações sociais.
Dois programas da ASA têm se transformado em molas mestras desta luta pelo Direito à Água e pela Convivência com o Semiárido. O P1MC, programa voltado para captação de água para consumo humano e o P1+2 voltado para captação de água para produção. Estes programas têm contribuído para gerar maior autonomia dos camponeses e camponesas, dinamizar as economias locais, mobilizar para gestão e gerenciamento da água, mas sobretudo em tono da Água como Direito de todos os povos. Esse processo tem gerado reflexões em torno: 1) da Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, sobretudo no que se refere à produção de alimentos seguindo os princípios da Agroecologia; 2) do resgate e conservação das sementes crioulas; 3) a conservação dos solos, das águas e da agrobiodiversidade; 4) da valorização e construção de conhecimentos locais; 5) dos direitos das mulheres camponesas, que representam mais de 50% do público envolvido; 6) do aumento na autoestima, por uma vida com mais saúde e dignidade no campo; e entre tantas outras, 7) de melhores perspectivas pra a juventude camponesa no meio rural.
A ASA é uma rede que constrói mobilização social a partir das práticas e iniciativas de Convivência com o Semiárido. Luta e influi na construção de políticas públicas que dialoguem com a realidade do Território.
Alexandre Henrique Bezerra Pires – Biólogo, Mestre em Extensão Rural e Desenvolvimento Local, Coordenador Geral do Centro Sabiá e Coordenador Executivo da ASA pelo Estado de Pernambuco.
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