Defesa da Caatinga: é preciso sancionar a política nacional de combate à desertificação

Por Eduardo Amorim

Emanuela Castro, da Casa da Mulher do Nordeste, Paulo Pedro, do Caatinga, e Riva Almeida, do Centro Sabiá, receberam prêmio Dryland Champions da UNCCD.

Apaixonado pelo bioma mais representativo da cultura sertaneja, o coordenador de projetos da ONG Caatinga, Paulo Pedro de Carvalho, está preocupado com a situação política brasileira e os efeitos que um golpe contra a Democracia podem ter também nas políticas de convivência com o semiárido e de preservação do meio ambiente. Ele foi entrevistado pela reportagem do Canto do Sabiá justamente no Dia Nacional da Caatinga, 28 de abril.

Para quem não sabe, a ação do homem já alterou mais de 80% do território originalmente ocupado pela caatinga. O nome do bioma é uma palavra originária do tupi-guarani, que significa “mata branca”. Ele é o único sistema ambiental exclusivamente brasileiro e possui extensão territorial de 734.478 km², correspondendo a cerca de 10% do território nacional. As temperaturas médias anuais são elevadas, oscilam entre 25°C e 29°C. O clima é semiárido; e o solo, raso e pedregoso, é composto por vários tipos diferentes de rochas.

A caatinga está presente nos estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Sergipe, Alagoas, Bahia, Piauí e norte de Minas Gerais. Paulo Pedro fala como apaixonado e técnico da ONG Caatinga, que recentemente sediou a Caravana Agroecológica e Cultural do Araripe, região escolhida no Nordeste para fazer parte da pesquisa que analisa o impacto dos sistemas agroflorestais nos ecossistemas do nosso país. O estudo foi conduzido pela Articulação Nacional de Agroecologia, com assessoria de professores da UFRPE e apoio da própria ONG.

Centro Sabiá – Como está a situação do bioma caatinga na atualidade, especialmente levando em conta o longo período de seca que vivenciamos no semiárido nordestino?

Paulo Pedro – Com a seca, a irregularidade nas chuvas especialmente a quantidade de precipitação  nesses últimos cinco ou seis anos, tem agravado significativamente o processo de degradação dos solos. A Convenção da ONU para Combate à Desertificação (UNCCD) considera que um dos processos agravantes das mudanças climáticas é exatamente a seca no semiárido brasileiro e a ação humana. O desmatamento, monocultivo, pastagens, sobrepastoreio, queimadas. Em solos rasos principalmente, então acontece a retirada da vegetação, substituindo por gramíneas, e ainda o excesso de animais nessas áreas que é o sobrepastoreio. As gramíneas não ajudam nesse processo e são um dos fatores mais significativos para a desertificação no Brasil. Nesses últimos cinco anos, o que era pasto está praticamente só o solo descoberto, na grande maioria das regiões, com exceção de alguns poucos terrítorios do semiárido onde ainda aconteceram chuvas mais regulares nesse período. Inclusive em relação à caatinga sofreu um dos períodos mais extensos de seca, é uma das maiores secas dos últimos 80 a 100 anos, não temos registros de um período tão longo nessa história desse último século. Pessoas que hoje tem 80 ou 100 anos dão depoimento que nunca vivenciaram durante toda suas vidas um período de seca tão longo.

Sabiá – Mas as secas do início do ano animaram muitos agricultores e agricultoras, elas não foram importantes nesse processo?

Essas chuvas em 2016 foram muito importantes, se não fosse isso a situação estaria ainda mais complicada, o que ajudou foi basicamente o mês de janeiro. Mas funcionou mais para a reposição de água de alguns depositórios, aqui em Pernambuco muito pouco, na divisa do Ceará, Piauí e Pernambuco ainda deu uma chuva razoável, mas a grande maioria dos territórios não teve uma precipitação tão alta. Ainda vemos árvores adultas morrendo e secando, não só arbustos, no Araripe (a ONG Caatinga tem sede em Ouricuri) e em outros territórios também que tivemos oportunidade de visitar através de intercâmbios… Teve também recuperação de alguma pastagem, 50% no máximo. Mas nasceu muito foi pastagem nativa, que tem um ciclo muito curto, e com a parada das chuvas elas já fecharam seu ciclo. Então, as chuvas neste ano ajudaram mais só no sentido de repor alguma quantidade de água e a pastagem.

Centro Sabiá – Em relação à agricultura como está a situação? 

Pedro Paulo – Em termos de produção agrícola, não teve muita importância na maior parte das áreas suscetíveis à desertificação. (Quem plantou teve) 100% de perda. Tem um impacto importante quando vemos a importância dos reservatórios porque – tanto as tecnologias de segunda água e de captação de água nos telhados. Uma boa parte chegou para cima da metade da capacidade e em algumas áreas chegou a encher totalmente, mas em algumas cisternas de produção as famílias estão guardando para o consumo da família, já que as chuvas não foram suficientes para encher as cisternas da primeira água (que captam a chuva que cai nos telhados). Essas tecnologias estão dando conta com a convivência com o semiárido. Pois conseguem uma quantidade de água que significa muito para a vida das mulheres. Podemos dizer hoje que as cisternas a gente pode comparar com as cuncas dos pés de umbuzeiro, pois com pouca chuva elas conseguem armazenar água para passar por um bom período de seca. 

Sabiá – O que é cunca mesmo… 

Paulo Pedro – O umbuzeiro é uma planta xerófita. Ela tem capacidade de armazenar água nas suas raízes. As cuncas são o nome popular que se dá às batatas dessa planta xerófita (Sobre xerofitismo: As plantas nativas da caatinga são xerófilas, ou seja, adaptadas ao clima seco e à pouca quantidade de água. Algumas armazenam água, outras possuem raízes superficiais para captar o máximo de água da chuva. E há as que contam com recursos pra diminuir a transpiração, como espinhos e poucas folhas. A vegetação é formada por três estratos: o arbóreo, com árvores de 8 a 12 metros de altura; o arbustivo, com vegetação de 2 a 5 metros; e o herbáceo, abaixo de 2 metros. Entre as espécies mais comuns estão a amburana, o umbuzeiro e o mandacaru. Algumas dessas plantas podem produzir cera, fibra, óleo vegetal e, principalmente, frutas) .

Sabiá – Como você vê a situação política atual do Brasil e se isso pode afetar a luta de quem defende o bioma caatinga?

A nossa luta de sociedade civil, em parceria com o Governo Federal, estados, prefeituras e até empresas é para que  as famílias experimentadoras tenham reconhecida sua luta para construir a cultura da convivência com o semiárido. Alcançamos níveis importantes de ações governamentais e políticas. Inclusive, as famílias não passam tanta dificuldade, tanto sofrimento, como quando comparamos com 15 anos atrás. Houve muitos saques em 1993 aqui no Araripe, ainda teve muitos saques. As pessoas passavam muita fome e chegavam ao ponto de ter que invadir os mercados e levar alimentos para suas famílias. Esse foi o ano em que a sociedade civil ocupou a Sudene, depois em 1999 seria criada a Articulação no Semiárido Brasileiro, durante a Conferência de Combate à Desertificação da ONU, que foi realizada no Recife. É claro que a gente entende que a ideia da convivência (com o semiárido), aliada à construção concreta de políticas públicas, já está enraizada na maioria da população. (Mas) a instabilidade política coloca em risco todos os direitos conquistados, e entre eles esse da sociedade civil na proposição, construção e implementação com protagonismo de redes e articulações como a Asa. Em termos de política, tivemos avanços na política nacional de combate à desertificação, que finalmente foi sancionada depois de oito anos no Congresso Nacional e agora está em vias de ser regulamentada pelo Governo Federal. Independente disso, no entanto, vivemos uma série de ameaças de perdas. Independente do resultado (da tentativa de golpe contra a presidenta Dilma Roussef), temos que acordar para fazer valer esse conjunto de instrumentos. O Planaplo, a Política Nacional de Ater, mas essa de combate à desertificação e mitigação dos efeitos da seca está só no papel. E de que forma podemos ajudar o Brasil a passar esse momento de crise? Colocando claro no hall das nossas lutas o combate à desertificação, porque fortalece a ideia da convivência com o semiárido e os eixos são os mesmos que trabalhamos na agroecologia, com uma Assessoria Técnica e Extensão Rural Sistêmica e Dialógica, 

Fonte de informações: http://brasilescola.uol.com.br/brasil/caatinga.htm

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Nós, do Centro Sabiá, desde 1993 promovemos a agricultura familiar nos princípios da agroecologia. Nossa missão é "plantar mais vida para um mundo melhor, desenvolvendo a agricultura familiar agroecológica e a cidadania". Seu apoio através de uma doação permite a continuidade do programa Comida de Verdade Transforma e outras ações solidárias e inovadoras junto ao trabalho com crianças, jovens, mulheres e homens na agricultura familiar.

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