As decididas do Nordeste comemoram 30 anos de luta feminista rural
Arte, mística, música, batucada, irreverência e solidariedade não faltaram no Encontro Foto: Gabriela Monteiro
Por Gabriela Monteiro (MMTR)
O Assentamento Normandia, em Caruaru-PE, esteve ocupado por centenas de margaridas nos dias 10, 11 e 12 de agosto. Foram mais de 200 mulheres participando sem medo de ser mulher no Encontro Regional do Movimento da Mulher Trabalhadora Rural do Nordeste (MMTR-NE) e celebrando juntas os 30 anos do Movimento no combate às mentalidades e estruturas de submissão. A luta protagonizada pelas trabalhadoras rurais nordestinas foi o tema central do Encontro, que contou com diversas assentadas, agricultoras, quilombolas, pescadoras, artesãs, professoras, estudantes e ativistas, partilhando experiências e construindo estratégias de resistência e transformação social.
A força das mulheres já começou a ser sentida na ciranda de abertura, com a apresentação das delegações estaduais, com suas bandeiras e símbolos dos territórios. Muitas parceiras e parceiros estavam presentes e também se apresentaram e saudaram o Movimento. Na mesa de abertura, intitulada “A coragem de ser: lutas, desafios e perspectivas das mulheres”, as convidadas contribuíram com reflexões valiosas sobre nossas identidades e práticas e o contexto em que vivemos. Miriam Nobre, da Marcha Mundial de Mulheres; Alessandra Lunas, da Marcha das Margaridas e Secretária de Mulheres da Contag; Sílvia Camurça, do SOS Corpo e da AMB e Andrea Butto, da UFRPE, fizeram falas importantes para impulsionar o fortalecimento da luta das mulheres e do feminismo rural. Diversas participantes também contribuíram para o debate, inclusive com poemas e canções. A noite foi reservada para uma emocionante homenagem às primeiras lutadoras, que fundaram o MMTR-NE e começaram a escrever essa história.
Arte, mística, música, batucada, irreverência e solidariedade não faltaram no Encontro. Toda hora era hora de puxar um Fora, Temer!, uma canção, um toré. As bandeiras e as camisas rosa pink enchiam de cor o Encontro, cuja decoração foi toda feita artesanalmente pelas mulheres, desde painéis e banners pintados à mão até às mandalas de linha, toalhas de fuxico e estandartes. A Feira Feminista seguiu animada nos intervalos, com produtos de todo o Nordeste. A programação do segundo dia apresentou quatro seminários temáticos pela manhã: Agroecologia, Feminismo e Quintais Produtivos, facilitado por Laeticia Jalil (UFRPE) e Graciete Santos (Casa da Mulher do Nordeste); Enfrentamento à Violência, com Cristina Buarque (Fundaj) e Raquel Baster (Sedup); Identidades e Territórios de Resistência, com a facilitação de Elisa Urbano (Povo Pankararu); e Participação Política das Mulheres, com Elba Ravane (Diversa) e Manina Aguiar (Centro das Mulheres do Cabo). A tarde seguiu intensa, com atividades descentralizadas. Foram realizadas oficinas sobre Comunicação; Corpo e Sexualidade; Auto-organização e autonomia econômica das mulheres; Saúde e conhecimentos tradicionais; Poesia e cordéis feministas.
A programação foi intensa, mas as mulheres estavam com toda energia para vivenciar esse momento histórico da luta das mulheres rurais. “Estou orgulhosa de fazer parte de um evento lindo como esse. Sei da coragem, força e compromisso que nós mulheres rurais temos quando estamos organizadas. Mulheres de todo o Nordeste contribuíram com sua energia para este evento acontecer”, disse Ângela, uma das diretoras do Movimento da Mulher Trabalhadora Rural e Pescadora (MMTRP-AL). O clima foi de muito afeto e emoção no lançamento do livro Minha História em Poesia, da violeira paraibana e feminista Soledade, militante história do Movimento da Mulher Trabalhadora da Paraíba (MMT-PB).
O filme Mulheres Rurais em Movimento, realizado pelas trabalhadoras rurais junto com Héloïse Prévost, foi muito aplaudido e abrilhantou a festa dos 30 Anos do MMTR. O processo de construção do filme foi realmente coletivo, com as imagens captadas e as entrevistas conduzidas pelas próprias mulheres rurais. O resultado foi um filme com a cara das mulheres, no qual todas se sentiram reconhecidas e orgulhosas. E para animar a noite cultural, as mulheres das Casas Populares da BR 232 trouxeram um repertório com coco, forró e ritmos do Nordeste, contando inclusive com a participação de Dona Teté, das Taieras de Sergipe, militante do Movimento da Mulher Trabalhadora Rural de Segipe (MMTR-SE).
Conterrânea de Dona Teté, Madalena Santana é assentada e contou: “Estou contagiada pela magia da celebração dos 30 anos do MMTR-NE, palavras não expressam meu sentimento de pertinência de ser mulher e do Nordeste. Era utopia, um sonho. Que venham mais 30 anos de ousadia e criatividade, pois lugar de mulher é onde ela quiser!”. O dia do encerramento do evento, 12 de agosto, é também a data em que foi morta a líder sindical Margarida Alves – homenageada pela Marcha das Margaridas, que sempre acontece na mesma data. Uma mística poderosa, com dramatização, marcha pelo assentamento e plantio de muda trouxe a memória da vida e da luta de Margarida, da trajetória de 30 anos das mulheres rurais organizadas, das sementes de transformação social que ao mesmo tempo plantamos e somos. As delegações dos estados e as convidadas voltaram para casa renovadas e muito felizes, após a leitura da Carta Política do Encontro e do encerramento. Catarina de Angola, jornalista e parceira do MMTR-NE, traduziu bem o sentimento ao dizer: “Foi um dos encontros mais lindos da minha vida! Foi vivo, foi energizante, foi emocionante, foi de um aprendizado que não cabe em si. O feminismo rural é revolucionário!” conclui Catarina.
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