A saúde se fortalece nas comunidades, diz Zé de Santa, líder Xukuru
Ilustração: Pita Paiva
A saúde se fortalece nas comunidades, diz Zé de Santa, líder Xukuru
O dia 9 de agosto, também conhecido como o Dia Internacional dos Povos Indígenas é uma data criada pela Organização das Nações Unidas, a ONU, promovida para a garantia de direitos dos povos indígenas por todo o mundo. A luta dos povos indígenas é permanente, de resistência e existência. E é para falar sobre essas resistências, da comemoração da data e a importância da resistência, conversamos com Zé de Santa, vice-cacique, líder Xukuru, de Pernambuco, especialmente sobre os cuidados em tempos de pandemia. Confira os principais destaques desta conversa:
Caminhada e organização na luta por direitos
Sou o vice-cacique do povo Xukuru desde 2000. E venho nessa caminhada desde 1990, na caminhada de reinvindicação e organização e junto com os povos indígenas do Nordeste. Principalmente do meu povo Xukuru. Esse movimento começa quando os povos indígenas, desde 1970, começam a reivindicar os seus direitos à terra, à saúde, à educação, e quando a gente percebe que é negado por conta do Estado Brasileiro e de alguns movimentos políticos no país. Mas a gente conseguiu dar a volta por cima e, hoje, a gente tem alguns movimentos que podemos dizer para o mundo e para todos que nós temos hoje espaço adquirido através de grandes movimentos dos povos indígenas. Primeiro, organização dos povos de Pernambuco e do Nordeste e, segundo, organização a nível nacional para evitar de que alguém possa nos calar, pudesse nos calar nossa boca. A gente conseguiu, de fato, dar a volta por cima e hoje falar de fato quem somos, o que somos e o que queremos nesse Brasil que nós vivemos. Esse é um espaço… difícil para quando a gente não está junto e organizado com as lideranças e os mais velhos, que são os mais velhos os detentores da, de fato, do conhecimento tradicional, cultural e religioso dos povos. Dessa forma, foi o que os povos indígenas adquiriram para, de fato, contar a sua história e reivindicar, de fato, os seus direitos.
A gente vive essa história que, a partir que os povos começaram a se organizar e, de fato, fizeram suas próprias organizações, os povos indígenas adquiriram espaço que hoje são muito bons para os povos indígenas e, acredito eu, e a gente vive isso no espaço da educação. Os povos indígenas deram um passo muito grande, de fato dizer ao Estado Brasileiro e municipal, estadual e federal que nós teríamos que ter uma educação de acordo com a realidade de cada povo, porque cada povo tem uma realidade diferente, não é todo mundo igual. Até porque cada povo tem uma diferença muito grande. Até porque a gente vive nas aldeias, nós não vivemos nas cidades. Quando a gente vai para a cidade, a gente se sente meio perdido e, na aldeia, a gente tem mais liberdade, mais tranquilidade, a nossa saúde se torna muito mais fácil e prática de resolver, porque temos algumas coisas que nos ajudam, que é a questão da cultura do povo. Por exemplo, a questão de doenças. Há muitas doenças que não precisamos ir no médico, há algumas coisas que tem dentro dos povos que temos os nossos pajés, nossas rezadeiras que resolvem de fato algumas coisas e que não é preciso ir para o médico.
Saúde e combate ao Coronavírus
Volto aqui a falar sobre esse mal que aí está, que é o Coronavírus, que pegou, de fato, o mundo, o Brasil e o estado de Pernambuco de surpresa… Claro, quando a gente vai na nossa realidade, a gente sempre tem os nossos mais velhos que dizem que Deus muitas vezes nos deixa a mercê daquilo que a gente pratica. O Coronavírus, dentro dos povos indígenas, teve uma diferença do que os povos indígenas viram nas cidades, nas capitais. Os povos indígenas por conta própria tiveram de fazer a sua quarentena, se resguardar nas suas aldeias, fazer barreiras próprias, os próprios povos, com a organização própria do povo. Os povos indígenas fizeram muito isso e por isso também houve uma diminuição muito grande do contato do povo. Mas a gente acredita que, se o governo tivesse feito de fato logo no começo essas barreiras, essas paradas, essa proibição das pessoas ficarem transitando dentro da cidade, a gente teria muito menos pessoas contaminadas.
Quando a gente vai para a cidade, a gente se sente meio perdido e, na aldeia, a gente tem mais liberdade, mais tranquilidade, a nossa saúde se torna muito mais fácil e prática de resolver, porque temos algumas coisas que nos ajudam, que é a questão da cultura do povo. Por exemplo, a questão de doenças. Há muitas doenças que não precisamos ir no médico, há algumas coisas que tem dentro dos povos que temos os nossos pajés, nossas rezadeiras que resolvem de fato algumas coisas e que não é preciso ir para o médico.
Auxílio Emergencial
A gente sabe que esse valor poderia ser maior, mas a gente sabe também que não é só Pernambuco, é o Brasil inteiro que precisa disso, aqueles que trabalhavam, que de fato tiveram que sair dos seus empregos para garantir ou para se proteger do contato coletivo, do contato junto, do contato muito próximo um do outro. Esse salário, essa ajuda emergencial, ela valeu a pena… ele ajuda muito dentro da família, até porque a gente ainda está nesse meio desse Coronavírus, ele ainda não acabou. Na hora que a gente relaxar, ele pode de fato atingir o povo muito mais. Ele não está parado, ele está… ele está ali morninho, quietinho enquanto o povo não está fazendo aglomerações, não estão juntos para diluir ou distinguir mais essa doença. Esse salário ele está valendo a pena, eu acho que ele valeu a pena. Claro que quando a gente fala de governo, não podemos falar que isso é um projeto, um projeto político do governo, porque esse recurso já existe para quando se fala de uma pandemia dentro do povo, dentro de um estado, dentro de uma nação. Então, isso já tem aí pronto e o governo de fato tinha que fazer isso mesmo.
Ações nas comunidades
Sobre a economia dos povos indígenas, nesses tempos de Coronavírus, os povos indígenas usaram a diferença de que, dentro do seu povo, alguns locais já tinham mercados, vendas, que a gente chama de budegas, para vender algumas coisas necessárias… o povo fazia essas compras dentro do seu próprio povo, alguns povos que moram nas aldeias. Nas cidades era diferente. E, sobre a questão de quando precisava de mais coisa e não tinha nas barreiras, então tinha sempre os índios, tinha sempre alguns conhecidos que tinham algum meio de comunicação, ligava para os supermercados, para as lojas, para alguns lugares e eles vinham entregar o pedido daqueles povos nas barreiras. Então, chegava até a barreira, fazia aquele negócio… o banho de álcool-gel, de máscara, botava ali num canto, o pessoal dava um banho de álcool para poder pegar naquilo ali para trazer para a aldeia.
Dentro do povo, a economia se deu nesses termos. Alguns que teriam algumas coisas para resolver na cidade, questão de banco, de pagamento de carnê, de algumas prestações… então se fazia sempre alguns movimentos de pegar de uma, duas, três, quatro, cinco pessoas, uma ia fazer esse trabalho, então foi usado muito esse recurso e foi com que os povos de fato tivessem esse impacto bem diferente dentro das aldeias. Tivemos esse contato o mínimo possível na cidade, ou em alguns lugares onde de fato a gente sabia que o Coronavírus estava atuando com muita força. Havia um medo entre os mais velhos e entre os mais novos, também… Então, tinha uma conscientização dentro dos povos para que não tivesse essa caminhada, esse trâmite, esse trânsito de ida e vinda por conta de a transmissão desse vírus dentro das nossas aldeias. Então, a gente teve isso, e graças a Deus a gente evitou muitos casos. Teve alguns casos, mas foi o mínimo para a vista do que a gente vê nas cidades ou nas capitais. Dentro dos povos, só aqueles que moravam mais nas cidades, que viviam mais nas cidades foram mais afetados.
O vírus não acabou, ele está ali morninho, quietinho enquanto o povo não está fazendo aglomerações, não estão juntos para diluir ou distinguir mais essa doença.
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