2ª Jornada dos Povos de Pernambuco reforça a luta unificada pela identidade, terra e território dos
Objetivo maior do encontro foi estabelecer diálogo entre a Universidade e
a sociedade / Foto: Débora Britto – Acervo Centro Sabiá
Por Débora Britto (Centro Sabiá)
A 2ª Jornada dos Povos de Pernambuco foi realizada juntamente ao II Seminário Internacional de Agroecologia e III Seminário de Agroecologia de Pernambuco. O grande evento, chamado Diálogos de Conhecimentos sobre Agroecologia aconteceu de 22 a 24 de setembro, no campus Recife na Universidade Federal Rural de Pernambuco.
A expectativa de 800 pessoas inscritas chegou a ser superada: durante o evento, cerca de 2 mil pessoas circularam pelas instalações pedagógicas, rodas de conversa, palestras e mesas redondas promovidas. Nas rodas de diálogo, mais de 180 trabalhos de relatos de experiências ou artigos científicos foram inscritos, compartilhados e debatidos em dez rodas de diálogo agrupadas por temas relativos à Agroecologia. Durante os três dias, a Feira de Saberes e Sabores também foi local de encontro e troca entre os povos tradicionais e participantes da Jornada.
Segundo o professor Marcos Figueiredo, do Núcleo de Agroecologia e Campesinato/UFRPE, que organizou o evento, o sentido maior do encontro era estabelecer um diálogo entre a Universidade e a sociedade, os agricultores/as familiares agroecológicos em suas múltiplas formas. Para ele, o objetivo foi alcançado desde a abertura quando estavam presentes representantes de povos e comunidades, da Universidade, de órgãos públicos, movimentos sociais e organizações da sociedade civil. “Ainda temos o desafio de incorporar esse diálogo de saberes de forma efetiva nos currículos universitários. A Agroecologia é plural, bebe de diversas fontes”, afirmou.
Durante os três dias de evento, os participantes puderam apreciar a Feira
de Saberes e Sabores / Foto: Débora Britto – Acervo Centro Sabiá
A Agroecologia é a garantia de direitos, é a harmonia com a natureza, é o respeito, é feminismo também. “Precisamos entender e construir a Agroecologia não apenas como uma ciência ou um conjunto de práticas, mas como um modo de vida. E dentro disso há o reconhecimento das mulheres como sujeitos com escolhas”, pontuou Marli Almeida, da Rede de Mulheres do Pajeú.
Para Marcos, o compartilhamento dos conflitos enfrentados pelos povos estimulam também a resistência. “Os conflitos em função da apropriação dos recursos naturais também motivam a resistência dos povos sob muitas formas: a luta pelo território, pela identidade, pela soberania alimentar”, aponta e explica que essas são palavras-chave para o encontro. A Jornada foi o espaço onde os participantes puderam conhecer os desafios, entender os conflitos e lutar pelo reconhecimento de identidades para garantir os territórios e soberania alimentar com qualidade de vida.
Partilha e conexão com América Latina
Os conflitos socioeconômicos e ambientais foram abordados em mesas redondas e as contribuições dos agrossistemas tradicionais para a Agroecologia utilizados no Brasil e no México, assim como as lutas sociais do campesinato nos dois países.
Com a participação do agricultor mexicano Julián Canaré, do Conselho Indígena do México, houve uma troca de conhecimentos e, principalmente, o reconhecimento de que tanto no Brasil como no México o cenário de lutas e resistências se aproximam. O agronegócio avança e ameaça a agricultura familiar no Brasil e os povos tradicionais de modo semelhante ao que é feito no México. O mexicano compartilhou a vivência das lutas no seu país e de outros povos indígenas. “Os acadêmicos tem acompanhado os povos e orientado sobre os direitos deles. Creio que temos ferramentas legais para defender seus territórios. Se vamos defender nossa cultura, nossa identidade, temos que defender primeiro o nosso território porque onde é que nós vamos viver?”, declarou.
O agricultor Julián Canaré falou das semelhanças de lutas e resistência
entre México e Brasil / Foto: Débora Britto – Acervo Centro Sabiá
“Nós não estamos perdidos, estamos tentando viver”, disse também Iran Xukuru, do Povo Xukuru de Ororubá, ao reforçar a identificação com o que vivem os povos indígenas mexicanos. Ele lembrou o massacre que o povo Guarani Kaiowá, do Mato Grosso, está vivendo pelas mãos do agronegócio e a omissão do Estado. “Me dá tristeza de ver que nosso governo [como o brasileiro] se preste aos interesses do capital e não do povo”, respondeu Julián.
Comunhão de povos
As instalações pedagógicas trouxeram, em dias diferentes, as denúncias e ameaças com que convivem os povos e comunidades. No segundo dia, o momento foi de compartilhar as estratégias de resistência, a riqueza das práticas tradicionais de plantar e a construção da Agroecologia nos mais diversos territórios e culturas dos povos presentes. Por lá passaram tanto estudantes, pesquisadores, professores, agricultoras e agricultores de outros povos que desejaram conhecer diferentes culturas e modos de viver do trabalho na terra.
A luto pelo acesso à terra como garantia de direitos foi um ponto comum partilhados nas dez instalações que trouxeram Acampadas/os e Assentadas/os da Reforma Agrária, Povos Ciganos, Atingidas/os por Barragens, Mulheres Agricultoras, Pescadoras/es Artesanais, Povos de Terreiro, Povos Indígenas, Comunidades Quilombolas e Jovens Agricultores.
Após três dias de discussões, denúncias, partilhas e conexões de sonhos e lutas, a 2ª Jornada do Povos de Pernambuco foi palco para o plantio de uma muda da Jurema, planta sagrada para os povos indígenas e de matriz africana. No terreno da UFRPE, mãos quilombolas, pescadoras, de terreiro, agricultoras, assentadas e acampadas, atingidas por barragens, ciganas, indígenas e jovens plantaram a Jurema como símbolo de resistência e de fortalecimento – e crescimento – das lutas e dos povos e comunidades tradicionais de Pernambuco.
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