Água e Educação Contextualizada no Semiárido
Além das construções, o projeto Cisternas nas Escolas realiza formaçoes em
Educação Contextualizada com educadores / Foto: Acervo Centro Sabiá
Por Rodrigo Adrião (coordenador do projeto Cisternas nas Escolas do Centro Sabiá)
O projeto Cisternas nas Escolas, desenvolvido pela Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) com o apoio do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), visa a construção de 5 mil tecnologias de armazenamento de água (cisternas) até 2016, sendo na primeira etapa (que vai até o final deste ano) beneficiadas 2.500 escolas.
Para além das construções das cisternas, que influenciarão positivamente na vida letiva dos/as alunos/as, o projeto realiza formações em Educação Contextualizada no Semiárido (ECSA), voltada para os/as professores/as das escolas beneficiadas e formações em Gerenciamento do Recurso Hídrico Escolar (GRHE), direcionado para auxiliares de serviços gerais e merendeiros/as, garantindo o debate sobre a educação do campo, a valorização dos saberes e da realidade local, segurança e soberania alimentar.
Uma das 30 organizações que estão desenvolvendo o projeto, o Centro Sabiá irá construir 83 cisternas em escolas de oito municípios do Agreste pernambucano (Santa Maria do Cambucá, Bom Jardim, Passira, Cumaru, Panelas, Jataúba, Brejão e Bom Conselho), realizando 8 formações em GRHE (uma em cada município) e 24 formações em ECSA (sendo três módulos em cada município).
Os alimentos consumidos durante as formações são agroecológicos, comprados aos/as agricultores/as familiares que são assessorados pela chamada pública de ATER – Agroecologia executada pelo Centro Sabiá, fato que assegura o debate do comércio ético e solidário, da segurança e soberania alimentar.
O primeiro módulo da formação em ECSA que o Centro Sabiá realizou foi no município de Santa Maria do Cambucá e contou com a presença de dois professores/as por escola beneficiada, totalizando vinte participantes. Ele foi dividido em duas partes: na primeira se abordou como tema o Semiárido brasileiro (SAB), se refletiu a respeito da educação que vivenciamos, e sobre qual o papel social da escola do campo; já na segunda parte, construímos o mapa social do município e refletimos sobre a educação atual que fazemos e a educação que queremos. Com isso mapeamos a realidade da educação no campo, reconhecendo seus limites.
A formação em Educação Contextualizada de Santa Maria do Cambucá contou com
professoras das escolas beneficiadas / Foto: Acervo Centro Sabiá
Primeira parte
O projeto Cisternas nas Escolas foi brevemente apresentado, e descrita desde a trajetória histórica da ASA Brasil, mobilização e luta social em busca de políticas públicas de convivência com o Semiárido, até o nascimento do Projeto devido à situação de carência de água em que se encontram algumas escolas do campo (segundo o Ministério da Educação – MEC, mais de 10.000 escolas do Semiárido brasileiro não têm acesso à água). Os/as participantes colocaram que conheciam parentes, amigos/as próximos/as, ou eram eles/as próprios/as beneficiários/as de projetos sociais para acesso à água e sabiam de perto a mudança de vida depois do acesso a políticas públicas.
Durante a formação, informações foram apresentadas, refletidas, debatidas, construídas, descontruídas e reconstruídas a partir da compreensão pessoal de cada um/a se construindo coletivamente o conhecimento. A primeira provocação surgiu a respeito da compreensão do que é o Semiárido brasileiro, que tipo de educação vivenciamos e qual o papel social da escola do campo. Percebeu-se um misto de entendimentos a respeito do conceito de Semiárido: “É uma terra seca, com pouca produção e pouco conhecida”. Outro/a cita: “É um clima quente seco, predomina a Caatinga, com pouca expectativa de chuva e a falta de água prejudica o solo e a plantação. Na minha comunidade, em Gameleira, o Semiárido é devastado pela exploração do calcário”.
Quanto a reflexão sobre a educação que vivenciamos, destacamos: “É uma educação contextualizada, mas com algumas lacunas, falta comprometimento da sociedade, da família e também das políticas públicas. Uma barreira a ser vivenciada dia após dia”. Em relação à função social da escola, foi unânime a ideia de formar cidadãos críticos para atuar na sociedade.
Dois textos foram debatidos pelos presentes, divididos em grupos: “Conhecendo e refletindo sobre o Semiárido e a Agrofloresta”, de Mariene B, Santos C, Oliveira C e Souza Z e “Ensinar exige apreensão da realidade”, de Paulo Freire. Os grupos fizeram apresentações sobre os textos, com muita criatividade e conteúdo, destacando-se paródias com músicas (Xote ecológico e Asa branca, de Luiz Gonzaga), além do grupo que realizou um teatro de fantoches.
Segunda parte
Os/as participantes mapearem as suas comunidades e, por consequência, o munícipio. Foi aberto um grande mapa com as delimitações do munícipio desenhadas, porém vazio, sem elementos ou referências. Os/as participantes foram provocados a localizarem elementos sociais e ambientais nas comunidades onde as escolas se encontram, como associações, outras organizações sociais, equipamentos públicos, fontes de água e experiências agroecológicas.
Após o mapeamento, foram feitas as seguintes perguntas:
1. Você, educador/a, vive na comunidade?
2. Quanto tempo trabalha na escola?
3. Quais as características de seus educandos/as?
4. Quais os desafios/problemas da sua realidade?
5. Que experiências de educação contextualizada são desenvolvidas?
A maioria das professoras tem anos de trabalho nas comunidades, alguns/umas vivem no entorno escolar, outras/as não. Em relação aos desafios enfrentados destacaram-se a violência, desagregação familiar e a transferência da responsabilidade total da educação das crianças para a escola. Percebe-se que a educação pouco é contextualizada com a realidade local, com estímulos pontuais e com predominância da utilização de literatura descontextualizada.
Como recurso visual e pedagógico foi passado o filme Cisternas nas Escolas produzido pelo Centro de Assessoria do Assuruá (CAA), organização que desenvolveu o programa-piloto do projeto, ainda em 2009. E a tarefa que ficou, ao final da formação, foi ler e sintetizar o texto “As tramas da identidade”, de Rocha T.
Esperamos com estas formações que os/as educadores/as saiam com ânimo e subsídios pedagógicos para aproximar e contextualizar a educação praticada, que se critique a educação que fazemos para que desta maneira pratique uma educação com maior qualidade e veracidade. Acreditamos que estes momentos irão provocar uma reflexão sobre a prática da educação nas escolas beneficiadas, e de certa forma na realidade educacional do município, estimulando uma tendência de melhora na qualidade do ensino-aprendizagem e consequentemente na qualidade da educação municipal.
Paródia xote ecológico/ Ensinar exige preocupação
O ponto de partida pra nossa reflexão
É o que diz respeito a nossa educação
E como professor preciso conhecer
As diferentes formas de aprender
A nossa capacidade de aprender
Transfere o pensamento para o saber
Trabalhando as diferenças com evolução
Transformando o ser humano com mais educação
Como professor não tenho outra opção
Mediar o conhecimento é minha obrigação
Derrubar as diferenças que aqui estão
Contextualizando a cultura de cada região
Com um futuro melhor
Temos que sonhar
Só através da educação
Poderemos mudar
Exercendo com alegria
Nossa missão nós professores
Mudaremos a nação.
Que bom ter você por aqui…
Nós, do Centro Sabiá, desde 1993 promovemos a agricultura familiar nos princípios da agroecologia. Nossa missão é "plantar mais vida para um mundo melhor, desenvolvendo a agricultura familiar agroecológica e a cidadania". Seu apoio através de uma doação permite a continuidade do programa Comida de Verdade Transforma e outras ações solidárias e inovadoras junto ao trabalho com crianças, jovens, mulheres e homens na agricultura familiar.