O centenário de Francisco Julião marca a vida de um eterno lutador da Reforma Agrária
O advogado, político e escritor Francisco Julião foi uma das lideranças das Ligas Camponesas. Se estivesse vivo completaria 100 anos
Da Página do MST
Na última segunda-feira (16), o advogado e militante Francisco Julião Arruda completaria 100 anos se estivesse vivo.
Julião nasceu no Engenho Boa Esperança, no agreste pernambucano. Formou-se em 1939, em Recife, e foi um dos grandes responsáveis, junto às Ligas Camponesas, pela desapropriação das terras no Engenho Galiléia, a primeira desapropriação de terra no Brasil após a 2ª Guerra Mundial.
Cento e quarenta famílias de trabalhadores rurais viviam da agricultura de subsistência nas terras do Engenho Galiléia, arrendadas pelo proprietário Oscar Arruda Beltrão. Diante do aumento do valor cobrado pelo proprietário, os trabalhadores já não conseguiam pagá-lo.
Diante da situação de penúria geral, os trabalhadores decidiram, em 1955, fundar a Sociedade Agrícola e Pecuária de Plantadores de Pernambuco (SAPPP), primeira associação camponesa de Recife. Nos anos seguintes o tipo de associação adotada no engenho da Galileia se multiplicou no estado de Pernambuco. Estas associações camponesas, então, se tornaram as Ligas Camponesas.
Julião assumiu a defesa jurídica da SAPPP, e, sendo eleito deputado em 1954 pelo PSB (o primeiro parlamentar eleito pelo partido no estado), apresentou, na Assembléia Legislativa, o primeiro projeto de lei para desapropriação do Engenho Galiléia, argumentando que “a Constituição do Estado declara, no seu artigo 155, que ‘o uso da propriedade será condicionado ao bem-estar social’”.
Em Agosto de 1955, representantes das Ligas participaram do Congresso pela Salvação do Nordeste, organizado pela Prefeitura de Recife, que teve Julião como presidente de honra, num contexto em que já defendia a necessidade de uma mudança radical no sistema de propriedade da terra e de produção agrícola no Nordeste.
“Quando ele chegava aqui, era uma festa. O povo ia buscar ele com as enxadas nas mãos, levava nos braços. Minha finada mãe jogava pétalas de rosas”, conta Zé Biu, agricultor de 80 anos que vive no Engenho Galileia.
Em 1958 foi reeleito com expressiva votação para mais um mandato na Assembleia Legislativa de Pernambuco, na legenda do Partido Socialista Brasileiro (PSB). E em 1959, venceu o processo judicial que garantiu a posse das terras do engenho da Galileia para seus moradores, baseando-se em uma lei recém-promulgada que determinava a desapropriação da propriedade com pagamento de indenização ao antigo dono.
As Ligas Camponesas começaram a obter repercussão nacional e a despertar o interesse da imprensa. O movimento ultrapassou efetivamente as fronteiras de Pernambuco a partir de 1959 com a fundação da primeira Liga Camponesa paraibana. Em 1960, o jornal The New York Times publicou uma série de artigos sobre as Ligas, apresentando Julião como líder do campesinato brasileiro e apontando a gravidade da situação econômica e social do nordeste brasileiro.
No entanto, Julião desmente ter fundado as Ligas Camponesas. “Não fundei a Liga – ela foi fundada por um grupo de camponeses que a levou a mim para que desse ajuda. A primeira Liga foi a da Galiléia, fundada em 1° de janeiro de 1955, e que se chamava Sociedade Agrícola e Pecuária dos Plantadores de Pernambuco. Foi um grupo de camponeses com uma certa experiência política, que já tinha militado em partidos, de uma certa cabeça, que fundou o negócio, mas faltava um advogado e eu era conhecido na região. Foi uma comissão à minha casa, me apresentou os estatutos e disse: ‘existe uma associação e queríamos que você aceitasse ser o nosso advogado’. Aceitei imediatamente. Por isso o negócio veio bater na minha mão. Coincidiu que eu acabara de ser eleito deputado estadual pelo Partido Socialista e na tribuna política me tornei importante como defensor dos camponeses.”
A força das ligas começou a decrescer a no final de 1962, ao mesmo tempo em que se acelerava o processo de enquadramento institucional do movimento camponês. Com o aumento da repressão no campo e o início da ditadura militar, Julião foi perseguido e preso. Exilado, deixou o país em 28 de dezembro de 1965 com destino ao México. Com a anistia política de 1979, retornou ao Brasil.
Logo depois, em 1986 concorreu a uma vaga de deputado constituinte por Pernambuco, na legenda do Partido Democrático Trabalhista (PDT), não tendo sido eleito. Em dezembro do mesmo ano, viajou de volta para o México, onde faleceu em julho de 1999 de infarto, na cidade Guernavaca, estado de Morelos.
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