Lei Maria da Penha – 8 Anos de Luta contra a Violência contra a Mulher
Banner da Campanha Compromisso e Atitude no Enfrentamento à Impunidade, da Secretaria de Políticas para as Mulheres do Rio Grande do Sul / www.spm.rs.gov.br
Por Laudenice Oliveira e Alex Carvalho (Centro Sabiá)
Dados de violência contra mulher dão conta de que a cada quatro minutos, no Brasil, uma mulher é vítima de violência. A maioria das vezes essa violência é praticada dentro de casa, por companheiros, namorados. Para coibir e punir agressores, criou-se a Lei Maria da Penha, instituída em agosto de 2006. Este ano, completam-se oito anos de sua criação.
Dados coletados entre janeiro e junho de 2014, pela Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180, da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República (SPM-PR), revelam que 77% das brasileiras em situação de violência sofrem agressões semanal ou diariamente.
A Lei Maria da Penha, entretanto, é uma ferramenta importante para as mulheres fazerem uso e denunciar os abusos e crimes cometidos contra elas. Informações da SPM-PR contabilizam que 20% das denúncias já são de mulheres que sofrem a primeira agressão, o que revela que a Lei contribui para encorajar as mulheres a fazerem as denúncias.
No Meio Rural – De acordo com a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), a aplicação da Lei Maria da Penha no meio rural é mais difícil. Essa dificuldade se dá por falta de acesso à informação sobre a Lei, de serviços, de estrutura e agentes capacitados para compreender a situação e aplicar a Lei.
Para falar sobre a Lei Maria da Penha e apontar avanços e problemas para a sua aplicação, em especial no meio rural, O Canto do Sabiá conversou com Nivete Azevedo, coordenadora do Centro das Mulheres do Cabo. Acompanhe a entrevista
O Canto do Sabiá – Qual a importância da Lei Maria da Penha?
Nizete Azevedo – A lei reconhece a violência contra as mulheres como um crime. Antes a violência doméstica contra mulher era considerada como uma violência de menor potencial ofensivo, como se os homens fossem proprietários das mulheres. A Lei vem mudar essa cultura, inclusive jurídica e social que a violência contra mulher é um crime mesmo de potencial ofensivo alto, sério, desumana. Com essa Lei tivemos um instrumento legal que vai dar conta da violência doméstica para que as mulheres possam criminalizar o agressor. Isso foi uma conquista muito importante para fortalecer a luta das mulheres que ficava muito na invisibilidade. Além da violência física, também existem outras violências sofridas por mulheres: as violências psicológica, patrimonial, o assédio moral, um rol de violências que não eram tipificadas juridicamente.
OCS – Como você vê a divulgação da Lei?
NA – A gente não conseguiu ainda que o próprio Estado fizesse o processo de divulgação, de conhecimento massivo da Lei por parte das mulheres. Isso tá num processo e a gente precisa fortalecê-lo. É importante dar um salto, fazer as mulheres tomarem conhecimento desse instrumento. A gente tem uma Lei que ainda não tá na mão da sociedade como um todo. Mas estamos caminhando nesse sentido.
OCS – A Lei deixa as mulheres mais tranquilas para fazer a denúncia?
NA – Sem dúvida nenhuma. Por mais que a gente tenha ainda na violência doméstica uma questão como grande desafio da luta das mulheres feministas, porque essa violência ela continua alta, ela continua acontecendo. Mas a Lei trouxe como conquista um instrumento muito importante. Por onde a Lei é mais divulgada, onde têm os instrumentos, nas denúncias elas se sentem muito mais fortalecidas, muito mais respaldadas social e juridicamente pra denunciar essa violência e para barrar essa violência. A questão agora, é que essa Lei não acontece sozinha. Ela precisa dos organismos de fortalecimento das mulheres, as políticas de apoio e defesa das mulheres, é um conjunto. Mas sem dúvida nenhuma ter a Lei como um instrumento à disposição das mulheres para defender o seu direito na punição, na responsabilização dos agressores isso trouxe um diferencial e as mulheres passaram a se sentir muito mais fortalecida para fazer as denúncias, para buscar os órgãos competentes para punir esses crimes.
OCS – E no meio rural, a conscientização das mulheres em relação à Lei Maria da Penha é igual a das mulheres do meio urbano?
NA – Eu não ariscaria dizer com tanta precisão, se sim ou não. Mas obviamente o movimentos de mulheres, os organismos para as mulheres, a informação para as mulheres eu acredito que elas têm chegado mais na área urbana, porque concentra mais o acesso à informação, o acesso aos organismos de defesa e proteção das mulheres. A dificuldade das mulheres rurais de acessar os centros onde estão esses organismos, de acessarem essas informações sobre o que tá acontecendo o que tem de avanço ainda é mais precária do que para as mulheres urbanas. Isso é uma questão de políticas públicas mesmo. Como fazer esse acesso, como fazer chegar isso em todos os recantos, para todas as mulheres, para toda a sociedade. Na Mata Sul (Pernambuco), as informações têm chegado muito através do rádio. Há um programa chamado Rádio Mulher que é um instrumento muito importante para divulgar a Lei Maria da Penha. Coloca essa possibilidade de levar essa informação para muitos lugares dessa região. É preciso ainda fortalecer muito os instrumentos que levam essas informações, porque de fato quando você pensa em uma estrutura de acesso aos direitos das mulheres rurais isso ainda é mais precário que para as mulheres urbanas. As políticas públicas ainda não dão conta de todos os direitos necessários. Eles precisam ser universalizados e isso precisa ficar na nossa pauta, na agenda do movimento feminista.
OCS – O que mais você acha importante acrescentar sobre essa Lei?
NA – Dizer que o primeiro caso da aplicação da Lei Maria da Penha foi de uma mulher acompanhada por nós aqui do Centro das Mulheres do Cabo. Uma mulher inclusive de origem rural que morava na periferia urbana da cidade e que viveu 18 anos sob a violência do marido. No primeiro dia que a Lei entrou em vigor nós conseguimos que esse agressor fosse preso. O fato de sermos um movimento de mulheres organizado, com acesso à informação possibilitou que uma companheira usufruísse desse direito conquistado, por isso é importante a informação e a organização. Inclusive, nós tivemos muita dificuldade para que o delegado que estava de plantão aplicasse a Lei, porque ele nem tinha ainda o conhecimento de que ela já podia ser aplicada. Tivemos que apelar para a promotoria, juízes, fizemos uma verdadeira via crucis para de fato ele se convencer de que já podia aplicar a Lei. Uma outra coisa é o processo que a gente vem fazendo para divulgar a Lei, os encontros,, buscando momentos para avaliar em que medida ela tá sendo acessada pelas mulheres, porque a gente reconhece de fato esse limite de efetivar a potencialidade que é um instrumento desse em favor do enfrentamento da violência, que reverte o crime, que pune o crime, então essa luta a gente vem fazendo todo o esforço para divulgação. Agora isso precisa ser encampado como política pública, porque o movimento de mulheres e a organização das mulheres não dá conta disso. O universo é muito grande e o problema é muito sério, ele é maior do que o que a gente enxerga, porque ele ainda tem muita invisibilidade. Então fortalecer a mulher para denunciar, levar a mulher a conhecer o instrumento, melhorar a qualidade do atendimento dos organismos de políticas para mulheres que já existem como os centros de referências, como as delegacias de mulheres é uma luta que é grande porque não basta ter só a Lei em vigor.
*Com informações da Agência Brasil e da Campanha Compromisso e Atitude.
Que bom ter você por aqui…
Nós, do Centro Sabiá, desde 1993 promovemos a agricultura familiar nos princípios da agroecologia. Nossa missão é "plantar mais vida para um mundo melhor, desenvolvendo a agricultura familiar agroecológica e a cidadania". Seu apoio através de uma doação permite a continuidade do programa Comida de Verdade Transforma e outras ações solidárias e inovadoras junto ao trabalho com crianças, jovens, mulheres e homens na agricultura familiar.