Estouro de barragens no Sertão do Pajeú em meio à pandemia da COVID-19 traz reflexão de como nós juventudes camponesas da agroecologia podemos contribuir numa situação como essa?

Foto: Comissão de Jovens Multiplicadores/as da Agroecologia (CJMA)

Estouro de barragens no Sertão do Pajeú em meio à pandemia da COVID-19 traz reflexão de como nós juventudes camponesas da agroecologia podemos contribuir numa situação como essa? 

Por Tatiane Faustino, jovem multiplicadora da agroecologia do município do Sertão do Pajeú e estudante do curso de bacharelado em agroecologia, campesinato e educação popular (UFRPE)

A chuva, no Sertão do Pajeú em Pernambuco é sempre motivo de muita alegria, a vegetação seca e acinzentada, ganha outros tons de verdes, são flores, folhas e animais que caracterizam esse novo visual na paisagem, é a estação do inverno, ou invernada como chamamos. As chuvas renovam a esperança dos sertanejos e das Sertanejas. 

É tempo de adubar e arar o solo para plantar o roçado. Feijão, fava, milho, jerimum, quiabo, maxixe, cebolinha e cheiro verde, são culturas comuns. Também é um bom momento para aumentar a criação de animais, já que pasto nativo em abundância nascerá. O dia 19 de março dia de São José, padroeiro dos agricultores/as, é o escolhido para plantar o milho para as festas de São João, e São Pedro, festejos tradicionais do Nordeste. É a estação que faz a gente trocar o comprimento “bom dia”, por: choveu lá? Assim como a Caatinga, o sertanejo também enverdece.

Nesse momento arrodeado de tanta beleza, e esperança, tem sido um momento também de muita preocupação e tristeza nesse território. As precipitações tem acumulado um montante de água nos açudes, e quase todos de grandes e pequeno porte estão transbordando. Sendo os principais o açude de Brotas em Afogados da Ingazeira e Barragem do Rosário em Iguaracy, esse último há onze anos não vertia.

Foto: Comissão de Jovens Multiplicadores/as da Agroecologia (CJMA)  

O cenário é de terra encharcada, alagada, a plantação está morrendo, a segurança alimentar ameaçada. São comunidades sem acessibilidade, sem energia e internet. Já são centenas de comunidades e famílias em duas situações de isolamentos, pelas chuvas e pela nova COVID_19, vírus que causam infecções respiratórias, e que já matou mais de 20 mil pessoas e 108 mil infectados no mundo. 

Os municípios de Afogados da Ingazeira, Tabira, Flores, Carnaíba, Ingazeira e Serra Talhada foram e vem sendo atingidos fortemente pelas chuvas. No dia 25 de março aconteceu o rompimento de uma barragem no sítio Cachoeira da Onça no município de Afogados da Ingazeira, esse rompimento atingiu centenas de famílias, e vinte e sete destas ficaram desabrigadas. Eles/as estão alojadas em três abrigos provisórios. A força da água foi tão grande que móveis saíram pelos telhados das casas. Idosos/as, cadeirantes foram resgatados/as, outros arrastados por populares, numa situação preocupante.  Em meio a um cenário de destruição, penúria e caos a população, o governo municipal, as igrejas, e a região estão se mobilizando para arrecadar doações para ajudar as famílias desabrigadas, que perderam suas casas, suas roupas e móveis, e o sossego da vida. 

Na minha comunidade (Umburanas que fica no município de Afogados da Ingazeira) estamos sentindo na pele como tá sendo difícil este momento. Para mim e para minha família, pois moramos a beira rio, e já não podemos nem dormir direito, já não podemos plantar, nem usar a água do rio, pois está contaminada com tudo que os humanos deixam para trás (lixo, agrotóxicos e esgoto). As nossas terras estão alagadas pelas represas das barragens, fazendo morrer toda lavoura plantada. Minha mãe e pai, que são idosos nem estão cumprindo a quarentena preventiva para não contaminação do corona vírus, ainda estão indo a feira fazer a comercialização para garantir o sustento da família. Vivemos exclusivamente da comercialização dessa produção e neste momento não estamos tendo opção de fazer escolhas.

Foto: Comissão de Jovens Multiplicadores/as da Agroecologia (CJMA) 

Sem dúvida tem sido momentos pra gente pensar em várias dimensões: como somos atingidos nessa pandemia? Como a agroecologia ajuda a dialogar com esse modo de vida? Como nós juventudes camponesas da agroecologia podemos contribuir numa situação como essa? Qual o lugar do campesino/a nesse contexto ambiental, e na ocupação de territórios de área de risco? Como nós comunicamos e anunciamos o campo?

É tempo de oração, de ter fé, de ficar em casa, zelar pela vida, principalmente dos nossos pais, dos nossos avós. O mundo tá doente porque a humanidade tá baixa. Esse modo capitalista de tratar as pessoas, os animais, os territórios, toda natureza, tá errado. Acredito que sobreviveremos, que logo nos abraçaremos, que seremos uma natureza melhor, e que nossas lutas precisam continuar, em defesa da vida das juventudes, das diversidades de mulheres, de homens, das crianças, da ciência, do Sistema Único de Saúde, da universidade pública e gratuita, da agroecologia.  

 

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Nós, do Centro Sabiá, desde 1993 promovemos a agricultura familiar nos princípios da agroecologia. Nossa missão é "plantar mais vida para um mundo melhor, desenvolvendo a agricultura familiar agroecológica e a cidadania". Seu apoio através de uma doação permite a continuidade do programa Comida de Verdade Transforma e outras ações solidárias e inovadoras junto ao trabalho com crianças, jovens, mulheres e homens na agricultura familiar.

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