Juventudes pernambucanas e maranhenses organizam intercâmbio de experiências de lutas e afetos

O Intercâmbio das Juventudes de Pernambuco e Maranhão reuniu jovens do FOJUPE (Fórum de Juventudes de Pernambuco) e as juventudes do Instituto Dica Ferreira e demais coletivos e instituições do Maranhão do campo e da cidade, em suas realidades diversas, em uma troca de saberes ancestrais, experiências de lutas e afetos

João Victor, vice-presidente do Instituto de Protagonismo Juvenil, com a colaboração de Janaina Ferraz, assessora das juventudes do Centro Sabiá

Foto: Comissão de Jovens Multiplicadores/as da Agroecologia – CJMA

Nos dias 11 a 15 de maio de 2022 ocorreu o “Intercâmbio de Experiências das Juventudes”, realizado pelas instituições EQUIP (Escola de Formação Quilombo dos Palmares), Instituto Dica Ferreira (MA) e o Fórum de Juventudes de Pernambuco, com parceria do Centro de Desenvolvimento Agroecológico Sabiá.

No primeiro dia a caravana de Pernambuco composta por jovens de diferentes regiões do estado foram recebidos calorosamente pela juventude aguerrida de São Luis do Maranhão. E a turma pernambucana foi então conhecer a comunidade do Coroadinho, região periférica da cidade de São Luis onde o Instituto Dica Ferreira atua.

Na comunidade pudemos participar das apresentações culturais como o Tambor de Crioula, organizado por Seu Felipe e Dona Meire, manifestação cultural que envolve dança e ritmos afro-brasileiros. Também conhecemos outros ritmos populares trazidos pelo Grupo Abanjá – Centro de Cultura Negra, primeiro grupo de dança afro de São Luiz, com os ritmos do Divino, Cacuriá e Tambor de Mina. Os maranhenses nos deram um recado: tudo aqui é conectado a ancestralidade, luta e alegria de viver.  

No dia 12 as atividades foram realizadas no Salão Paroquial da igreja do Parque Timbira no Coroadinho. No espaço houve a abertura dos trabalhos com um toré, dança ritual indígena, realizado pelo jovem indígena João do município de Surubim/PE. Como também aconteceu um momento de autocuidado e mística sendo fechado com uma ciranda de afeto com todos os presentes. A partir daí foram entregues diferentes tipos de sementes para cada pessoa.

Foto: Comissão de Jovens Multiplicadores/as da Agroecologia – CJMA

No segundo momento formamos subgrupos a partir da identificação das sementes que distribuímos, para dialogar em cinco minutos sobre a seguinte questão: “Quais as sementes que estamos plantando no mundo que fortalece nossa caminhada para estarmos aqui hoje?” O primeiro grupo relatou a importância do legado, das somas de nossas lutas individuais e coletivas.

O segundo grupo destacou a importância de juntar as juventudes do Nordeste nesse momento. O terceiro grupo escolheu a palavra diversidade para expressar a nossa força visto que estávamos com a presença de vários estados do nordeste, dos vários segmentos, das várias lutas e pautas ali representadas. O quarto escolheu a resistência identificando a importância dos que construíram antes e dos que estão chegando “somos sementes que foram plantadas e esse bebê (que estava no grupo) futuramente estará nesse espaço, também plantando” em referência aos erês e kunumins que acompanhavam com suas brincadeiras o momento. O quinto grupo plantou a semente da solidariedade ao próximo com companheirismo e amor. Por fim, ressaltamos a necessidade de nos conectar a partir do bem viver e não somente da sobrevivência, queremos viver e não só sobreviver!

No próximo momento foi realizada o compartilhamento das experiências dos movimentos que participaram do Intercambio. A FETAEMA (Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras do Estado do Maranhão) trouxe um pouco de suas conquistas durante alguns anos como a criação da Secretaria de Juventude em 2004 e com ela o projeto (Jovem Saber) que foi criado para identificar as realidades vividas pelas juventudes campesina e através dessa pesquisa lutar por políticas públicas voltadas para as juventudes e agricultura do campo. Outra contribuição massa foi a troca de experiências sobre o Festival Nacional de Juventude, que também acontece a nível estadual e municipal. Já o Instituto Dica Ferreira emocionou a todos os presentes ao apresentar o vídeo que fala um pouco sobre a resistência e o legado de Dica Ferreira, a luta por políticas públicas voltadas para a população do polo do Coroadinho, a fala da turma do instituto foi sobre os projetos promovidos pelos mesmos como danças e ritmos que reuni a população para fazer aula de zumba, pré-vestibular universitário com a aprovação de 14 alunos em universidades federeis e estaduais, além de capacitações e minicursos como manutenção de ar-condicionado, doces e salgados e estética qualificando as pessoas da comunidade para o mercado de trabalho.

Foto: Comissão de Jovens Multiplicadores/as da Agroecologia – CJMA


O legado de Dica se mantém de pé e muito vivo na mão desses jovens. Com a caravana do FOJUPE, apresentamos as atividades a partir do mapa do estado onde pudemos observar o alcance geográfico das ações articuladas do Fórum. Entre as ações, podemos destacar:  a campanha Jovens Pelo Direito de Viver que foi lançada no ano de 2016 e tinha como objetivo de promover medidas que fortaleçam o Estatuto da Juventude a partir do fortalecimento das políticas públicas pelo bem viver dos jovens do Estado e as ações realizadas no período de pandemia como as distribuições de cestas agroecológicas para os/as jovens e suas comunidades. Tivemos um momento de apresentação da Secretaria Estadual da Juventude (SEJUVEM) que é ocupada por Tati Ferreira, mulher negra e periférica que utiliza dos espaços de poder para fortalecer as populações menos favorecidas do estado. A mesma é filha de Dica Ferreira e narrou sua relação com a EQUIP como espaço que lhe formou na juventude e as ações que são realizadas pela Secretaria como o Plano Estadual da Juventude que norteia as ações do Governo para esse segmento; o auxilio através do cartão de passagem para os universitários do Estado, garantindo assim a sua mobilidade e manutenção acadêmica; a Caravana de municipalização da Juventude que atua na divulgação e fortalecimento da juventude organizada atualmente em 32 cidades do estado do Maranhão e que possui como frutos 4 conselhos da Juventude, além de outras ações da SEJUVEM.

Na parte da tarde realizamos um passeio pelos pontos históricos do Reviver. Onde podemos conhecer o Museu do Reggae, Casa do Tambor de Criola, o Palácio do governo, o Espigão, entre outros pontos que contam a história de resistência do povo Maranhense. Concluímos o dia com aula de dança na Praça do Bom Jesus com o Projeto Dança e Ritmos – vida saudável, onde as mulheres da comunidade do Coroadinho se encontram para movimentar o corpo e tratar de pautas feministas como o combate da violência contra as mulheres, saúde, sexualidade, entre outros.

Foto: Comissão de Jovens Multiplicadores/as da Agroecologia – CJMA

O terceiro dia foi o momento de resgatarmos o que foi vivenciado anteriormente através da troca de experiências na organização das atividades da Juventude nos dois territórios: Pernambuco e Maranhão. Assim, começamos o momento de diálogo e socialização de experiências da Rede de Educadores/as do NE. A partir da apresentação de João Maria, Dica II, Francisca e Eulina, educadores que compõem a rede e que narram a construção da mesma e os desafios que se mantem na atualidade. Apresentação pontuou a importância de Dica Ferreira na rede e o seu legado na ação social através dos seus filhos e do Instituto. Os mesmos utilizaram como símbolo uma rede do que foi e do que a rede de Educadores e Jovens do NE pretende ser. A sócia Eulina pontuou a necessidade de continuidade para a transformação da sociedade mais justa, solidária e humanizada contra o ódio e o desprezo que está em pauta hoje. Tendo como ferramenta a tecnologia que une e as fronteiras em prol da construção coletiva a partir das ideias de Paulo Freire de Educação Popular e esperançar. Dica II, emocionada falou das lutas que já foram pautadas ao longo dos últimos anos e o momento político que nos encontramos de fortalecimento da democracia e da campanha eleitoral reforçando a importância do envolvimento dos/as jovens nesse processo. Além da defesa incansável de Dica Ferreira, sobre a importância da educação para a mudança de vidas dos/as jovens negros/as da periferia. Francisca narrou o recomeço dos trabalhos de Educação Popular em Caxias/MA após a pandemia do Covid-19. E pediu para as juventudes não deixarem a rede se rasgar, pediu que cuidem da rede e a fortaleçam para que os trabalhos sociais e educativos continuem para transformação da sociedade. João Maria pontuou o começo da sua ação com as juventudes, aos 16 anos no movimento juvenil, aprendendo a se entender enquanto sujeito político e que isso tem que ser fortalecido na formação das juventudes mantendo a autonomia dos/as jovens. Ele destaca que o papel da educação Popular no espaço de organização dos/as jovens, está diretamente ligado a política e a ação social. Para ele, estas são as formas que temos de articular e fomentar as juventudes, combatendo ao capitalismo e neoliberalismo através da cooperação e não da competição que repete a lógica de mercado e do individualismo. A mesa de debate trouxe Camila, ex-participante da Rede de Jovens do NE. A companheira refletiu sobre a experiência de ser jovem no contexto atual de Pandemia do covid-19, os altos níveis de ansiedade e um governo de extermínio. Relembrando também as construções que foram realizadas na sua época de jovem: o Festival da Juventude onde conseguiram juntar mais de 3 mil jovens na cidade do Recife/PE, além da Campanha realizada junto a Unicef e os cursos realizados através de cartas onde jovens dos mais diferentes locais conseguiam participar e concluir o mesmo. Demonstrando a partir das atividades a necessidade de organização dos jovens para a disputa das ações dentro dos governos. Outro desafio apresentado foi o diálogo com os grupos de jovens evangélicos mostrando a importância de todos os jovens participarem dos diálogos e da mobilização nas ações e pautas das juventudes.

Foto: Comissão de Jovens Multiplicadores/as da Agroecologia – CJMA

Assim concluímos as falas e abrimos para o debate a partir do questionamento “Que Redes Podemos Construir?” E seus subtemas. Dividindo em grupos a partir das pautas latentes e atuais do movimento das juventudes. O primeiro grupo apresentou a pauta da comunicação a partir das seguintes reflexões: a comunicação fortalecendo e unificando as pautas, comunicação clara, objetiva e criativa para favorecer os conteúdos das redes sociais, rodas de conversas sobre os temas variados: cultura, dança, música e a importância das ONGs e movimentos nessa pauta construindo atividades. O grupo com o tema da Educação popular pontuou: a importância de intercambiar troca de experiências como essa que estava acontecendo, possibilitando a prática da educação popular e fortalecendo as ações com as juventudes, trabalhar a partir do público infanto-juvenil estimulando a reflexão já na primeira infância apresentando as questões sociais. A representante da FETAEMA enfatizou a necessidade do fortalecimento das mães dentro das pautas sociais para que essas possam está dentro das atividades do movimento social juntamente com suas crianças. O terceiro grupo debateu o tema das políticas públicas e apresentou as seguintes questões: o dialogar com a comunidade para o entendimento do que é uma política pública a partir do relato das experiências na cidade de Surubim/PE. Onde a partir da organização foi construído o primeiro Conselho municipal de juventude da cidade de Surubim em 2013. O participante do grupo Sementes do Amanhã/MA pontuou que na sua cidade as políticas públicas ainda não avançaram, os direitos ainda estão no papel e não são efetivadas. O integrante do FOJUPE narrou que na sua cidade Ipojuca/PE também existe uma dificuldade de consolidação das políticas públicas dando como exemplo as escolas que ainda possuem um currículo defasado por serem da região do interior utilizando como justificativa que o interior não é local de desenvolvimento. O grupo conclui que existe a necessidade dá gente resgatar a importância de ocupar o espaço da política partidária entre os nossos, chega de votar em pessoas que não nos representam e não conhecem nossa realidade. A política tem que ser fortalecida dentro dos nossos territórios!

Foto: Comissão de Jovens Multiplicadores/as da Agroecologia – CJMA

 No horário da tarde, tivemos um momento para apresentação dos projetos de instituições sociais do Coroadinho, através da “Ação Falaê Comunidade”. O Presidente do Instituto Dica Ferreira e filho da Dica Ferreira, Alexandre Ferreira nos trouxe com grande emoção em sua fala a importância desse intercâmbio para o fortalecimento do legado de Dica e iniciou uma pontuação das iniciativas do instituto no Coroadinho como o projeto de documentário: “Outro lado da história”, onde contara a história do bairro desmitificando o estigma de ser um bairro violento. Outro projeto é Unicoroadinho pré-vestibular onde os professores que são do bairro dão aulas para jovens que desejam entrar na universidade, ao longo da existência do curso já foram aprovados 14 jovens em universidades públicas. Programa Dança e Ritmos projeto de dança para a comunidade que também realiza passeios na cidade e trabalha a perspectiva de gênero, o Hora do grau ação que leva aproximadamente 200 jovens para passeio ciclístico pela cidade com apoio da Secretaria de esportes e lazer do Estado e outros parceiros. O Capacitaê Comunidade ação que formou 131 pessoas sobre a temática do empreendedorismo na comunidade através de formações fornecidas por moradores da comunidade. Cursos disponibilizados: culinária, design de sobrancelhas, fotografia e mídia digital. E outras atividades voltadas para o fomento da cultura e comunicação popular no bairro como o Cine Favela que realiza sessão de cinemas para as crianças da comunidade, o qual tivemos a oportunidade de conhecer, e o Podcast Vozes da Rua – radio online que divulga informações sobre o bairro. Houve também a presença de outras turmas do Coroadinho como Sandra Preta do Institutos Guardiões, que realizou um torneiro e arrecadações de alimentos para pessoas carentes, e em seguida veio o projeto aula de samba, que se espalhou pelo bairro. Cris do NEDUC – Núcleo de Educação Comunitária de Coroadinho apresentou as ações do projeto feito para alfabetização de crianças da comunidade, como também a ação que arrecadou 8 toneladas de alimentos para as famílias do Coroadinho e ações como empreendedorismo para geração de renda.

No quarto dia tivemos a oportunidade de conhecer o projeto do Instituto Dica Miss Coroadinho, que ocorreu na praça do Bom Jesus e teve como tema: A Beleza não segue padrões, visando assim fortalecer a identidade das jovens a partir do seu território. Por fim, tivemos apresentação cultural do grupo de samba do bairro proporcionando o fortalecendo dos grupos artísticos locais. 

Quinto e último dia a partir da coordenação de Joana Santos e Tatiana, começamos o dia com o processo de avaliação do que foi vivenciado nos 4 dias de intercâmbio. Sendo assim, disponibilizamos um questionário de avaliação para que cada participante colocasse suas percepções do que foi vivido, assim como possíveis melhorias. Após esse momento dividimos os participantes em 3 grupos para que expressassem o que sentiram ou planejaram a partir das partilhas. Os grupos foram divididos pelos seguintes aspectos: Coração, Cabeça e Pés, cada parte de um corpo representava um aspecto da avaliação. Os participantes narraram como esse momento de construção coletiva foi importante e como podem construir novas ações e parcerias para fortalecer a juventude do Nordeste. Por fim, encerramos com a história de Catarina e o boi Formoso uma lenda da região, onde o boi morre e renasce como também toda a sociedade maranhense nessa época. A cultura afro e indígena se faz muito forte no dia a dia do povo maranhense, e a sua ancestralidade e acolhimento tocou cada uma e cada um que fez parte da caravana de Pernambuco, em vários momentos nos sentimos como irmãos que a muito tempo não se viam. As sementes germinaram nesse encontro e foram regadas com abraços e afetos no esperançar de um Bem Viver.

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Nós, do Centro Sabiá, desde 1993 promovemos a agricultura familiar nos princípios da agroecologia. Nossa missão é "plantar mais vida para um mundo melhor, desenvolvendo a agricultura familiar agroecológica e a cidadania". Seu apoio através de uma doação permite a continuidade do programa Comida de Verdade Transforma e outras ações solidárias e inovadoras junto ao trabalho com crianças, jovens, mulheres e homens na agricultura familiar.

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